segunda-feira, 8 de agosto de 2005

Tu tens coragem de abrir um blog?

Recife, 08 de agosto de 2005.


Desde que me entendo por gente, escrevo diários. Na minha biblioteca, em casa, tenho uma estante recheada de cadernos os mais diversos. Uns de capa dura, outros de capa mole, uns comprados no exterior, outros ali no centro do Recife, vários recebidos de presente, mas a essência é a mesma – eu sou um sujeito que escreve sempre, nas boas e más horas, nas alegrias e infortúnios. Outro dia fui dar uma olhada num diário de 1983 e reparei na letra ainda não consolidada, a assinatura começando a ganhar forma, e as palavras, sempre as palavras, me acompanhando em todos os momentos.
Confesso que sempre olhei atravessado para esse negócio de “blog”, porque me parecia algo narcísico demais – colocar o diário na Internet? Macacos me mordam, se colocassem meus diários na Internet, seria certamente uma das maiores agressões que eu poderia sofrer. Diário é, para mim, uma espécie de psicanálise com a própria alma, e pelo que eu sei, os psicanalistas não andam divulgando, na Internet, as confissões mais secretas de seus pacientes. São as intimidades, as coisas que exigem cuidado, são garatujas da alma, que precisam cuidado.
Acuso uma inveja ancestral de quem ter a coragem de escrever e publicar um diário on line, mas descobri que nem só de diários vive um “blog”. Aos poucos, comecei a reparar que vários jornalistas estavam usando este espaço para exercer livremente a profissão, sem aquela chateação do editor dizendo que não tem espaço, que a matéria vai ficar para amanhã, que precisa cortar o texto pela metade. Vejamos aí o caso do Ricardo Noblat, que dá furos na mídia inteira, com seu “blig do noblat”. Andei vendo também alguns escritores e poetas colocarem suas coisas no ar, compartilhando belezas, espalhando coisas novas. O melhor é que não é preciso pagar para ter um blog. E aos poucos foi me dando aquela “coceira no organismo”, como dizia uma empregada de um amigo meu.

Depois de manter a coluna “Estuário” no glorioso site “Aponte”, me transferi para o JC On Line, onde fiquei durante um ano. Quando saí do JC, no dia 28 de junho, fiquei meio órfão de uma imensa troca que estava havendo com os leitores. Pensei que fosse passar, mas esse negócio de escrever, de compartilhar sentimentos e olhares com as criaturas, acaba criando umas raízes meio poderosas. Passei o mês de julho disfarçando, fingindo que estava de férias. Assobiei, cuidei do jardim no quintal, chutei pedrinhas, joguei meu dominó sofrível, mas sentia, perdoem o péssimo trocadilho, uma saudade crônica das crônicas. Quantas coisas aconteceram, deus do céu! De vez em quando eu me pegava garatujando uns textos, pensando na próxima crônica. Mas, vinha a pergunta... escrever para onde?
Até que numa dessas longas caminhadas com Iramaraí, o cartão caiu (sim, porque ninguém mais usa ficha) – por que não deixar de frescura e criar um blog, para publicar as crônicas, ô abestalhado? Não sou tão preocupado com esses negócios de democracia, liberdade de expressão, comunicação alternativa? Na volta da caminhada, olhei no espelho e falei – estás vacilando, Samarone, deixa de queijo e cria teu blog, cabron!
Com a ajuda de Macksandra, na noite de domingo, finalmente criei o espaço para as crônicas (mas vou publicar, esporadicamente, alguns poemas e reportagens, que ninguém é de ferro). Para Macksandra, foi tudo simples, ela clica os espaços e o blog vai nascendo. Eu fico impressionado com esse pessoal mais inteligente, superior no tamanho do cérebro. Da minha parte, vivi momentos de aflição, temendo sempre o pior (sempre acho que a tela vai sumir e vou perder todos os arquivos, imagens etc), especialmente quando decidimos colocar uma foto, e ela ocupou um pedaço grande da página. “Danou-se, o cara escreve crônicas ou quer aparecer?”, seria o primeiro comentário, possivelmente do magro Valadares. A foto ficou para depois, para quando eu estiver mais calmo.
Hoje de manhã, cliquei no endereço e lá estava – estuáriope (infelizmente, algum blogueiro já tem o endereço “estuário”). Deu aquele nervosismo de todo começo, mas, no meu caso, isso funciona como um combustível generoso para enfrentar novos desafios. Por favor, dêem os descontos para os erros, imprecisões e coisas estranhas neste espaço. Todo começo é cheio de sobressaltos, com exceção daquelas criaturas que já nasceram prontas, mas lembremos que até Rimbaud sofreu muito na vida. Ai, meu São Francisco de Assis, quantos recomeços já vivi, nestes 36 anos...
Bem, hoje é só para dar um alô aos velhos amigos que caminharam comigo nas crônicas publicadas no JC On line: estou por aqui. A sensação é a mesma de quando encontro o professor Davi Vieira (agora meu sócio no bar), ali pelas 11h27 da manhã, de qualquer manhã recifense. Ele conversa, desconversa, atende telefonemas, fala sobre algum assunto fundamental, e depois de um silêncio dramático, teatral, olha nos olhos e pergunta:
“Tu tens coragem de tomar uma?”
Geralmente, depois da pergunta, ele dá uma salivada boa.
É preciso uma certa coragem para acompanhar o professor no copo, porque ele bebe com raça e dedicação. Precisei um pouco de coragem para criar um blog, mas já estou também salivando.
“Garçom, traz a primeira, que agora deu sede!”.
Sede de palavras, penso.
Então, que seja uma farra boa, uma mesa farta, muitos sorrisos e afetos, nos estuários da vida...


Para Macksandra, minha professora de blog.

13 comentários:

Anônimo disse...

como disse por e-mail, o blog está no ar, sim. já repassei o endereço pro povo!

satisfação poder ter o estuário de volta!

grande abraço!

Anônimo disse...

Eita, coisa boa tu aqui, Sama!
Vou vir sempre e lhe "linkar" no meu blog também.
Xêros e boa sorte!

Anônimo disse...

Que bom poder ler tuas crônicas de novo!
felicidades com seu blog!

beijos!

Anônimo disse...

Grande Sama! Muita sorte nesse novo recomeço! Que o estuário siga seu fluxo sempre! Abração!

Anônimo disse...

"Gracias a la vida, que me ha dado tanto
Me dio el corazon que agita su marco
Cuando miro el fruto del cerebro humano
Cuando miro el bueno tan lejos del malo
Cuando miro el fondo de tus ojos claros.
Gracias a la vida."
preciso dizer mais?
um cheiro grande,
fabiana

Anônimo disse...

Confesso que não te conhecia. Fiquei sabendo desse blog por uma amiga. E me identifiquei bastante com a história dos diários. Pra mim também seria uma "ameaça" escrever meus diários aqui. Colocar num blog meus pensamentos mais profundos, minhas alegrias e minhas tristezas... seriam muitas revelações para pessoas demais acessarem. Mas concordo com esse espírito de ter a oportunidade de escrever o que você gosta e ter pessoas com quem compartilhar, sem nenhum comprometimento, ou sem obrigação. Apenas, pela vontade de escrever.
Adorei o blog. Parabéns. Farei dele um de meus Favoritos.

Anônimo disse...

Samarone!

Parabéns! O gostinho da crônica ainda é o mesmo!

Sucesso, alegria e felicidade nesta nova caminhada, conte com a minha companhia.

Aquele abraço, Priscila

Anônimo disse...

Olá Samarone,
fiquei muito feliz pelo retorno do estuário! Te desejo sucesso nessa nova caminhada que, com certeza, virá! Parabéns e um forte abraço!

Anônimo disse...

"Ele voltou, voltou para ficar, p/q aqui, aqui é o seu lugar..." Muito bem, uma decisão louvável. Acredito que seja a continuação da sua caminhada para o encontro de muitas outras satisfações.Beijos! Suceeeesso!!!
Tania

Anônimo disse...

Samarone, meu filho, muito obrigada pela "mesa farta, pela boa farra" e por matar minha "sede de palavras" com esse novo estuário. Eu também pensava que blog fosse coisa de adolescentes que, pela falta de hábito de usar lápis e papel como nós, escreviam seus diários no computador e sentiam um mórbido prazer de divulgá-los na grande rede. Depois que comecei a conhecer blogs de pessoas importantes, principalmente jornalistas (minha irmã é jornalista e tem um lindinho)mudei de idéia. O estuário veio para reforçar esse novo pensamento, além de me dar aquele prazer que já estava na saudade. Volte a brilhar com toda a intensidade para nós, simples mortais, que precisamos da emoção de cada frase que você coloca aí.
Parabéns pela estréia! Abrirei diariamente essa página para saciar minha sede.
Um cheiro, de mãe.
Anna Christina.

Anônimo disse...

Samarone, não poderia ter recebido melhor notícia hoje com a volta do "Estuário", estaremos juntos novamente, saboreando os textos e reflexões que tanto nos emociona.

Um abraço do amigo Tricolor !!!

Alfredo Siciliani

Anônimo disse...

Sama,
adorei a idéia! Parabéns! Tudo de bom!
Paulinha Perrelli

Anônimo disse...

Samarone,

Agora eu e meus amigos do BNB estaremos livre da crise de abstinência de suas maravilhosas crônicas.

Valeu Macksandra pela mãozinha para trazer Sama ao mundo virtual.