segunda-feira, 23 de janeiro de 2006

Crônicas de Viagem (2) - O Silêncio de Brasília

Saio da quadra 314, na Asa Norte, vou sem rumo pelas ruas de Brasília, em meu passo de camundongo. Caminho, olho para a paisagem dos dois lados. São dezenas, centenas, milhares de apartamentos, Brasília não tem este fenômeno social da casa, quintal, jardim, pelo menos aqui na asa da borboleta é assim (meu amigo Gustavo diz que o Plano Piloto não tem o desenho de um avião, mas de uma borboleta, e concordo integralmente.)

Vou andando, o dia está lindo, um sol perfeito, depois vim a descobrir que estamos a 1.100 metros de altitude e tomei um susto, porque tenho um medo ancestral de altura. Para quem está no Recife, ou em qualquer cidade ao nível do mar, é só imaginar que estou escrevendo estas notinhas um quilômetro e cem metros acima do solo, acho que nunca estive tão perto do céu, já posso dizer que estou nas nuvens.

Passo por uma singela barraquinha, daquelas que vendem frango assado na fumaça, igualzinho ao Recife, pergunto o preço, à guisa de curiosidade.

“É doze reais, filho”.

“ Obrigado”, respondi, que coisa cara do oeste, foi o que pensei, mas é assim mesmo, para viver aqui, vá logo separando um bom dinheirinho. Garrafão de água mineral : R$ 6,50. Saco de gelo: R$ 4,50. Fui ao cinema à noite: R 17,00. Assisti ao filme chorando, não de emoção, mas com pena do meu orçamento.

Sigo caminhando, caminhando, quando olho no relógio, já caminhei 47 minutos, fim do primeiro tempo, paro em um banco para descansar. Estou defronte a um imenso edifício, é tudo muito limpo e organizado, árvores imensas e frondosas em todas as quadras, adoro árvores. Olho as janelas. Ninguém. Nem uma sombra singela na varanda, nada de um velhinho que leu Heidegger pensando na consistência do improvável. Não há um choro de criança, canção na vitrola, barulho de TV, sequer um reles cantor de chuveiro. Falta-me um latido de cão. Uma tosse, uma singela tosse não acontece. Há um silêncio profundo, irreversível. Por sorte, os pássaros iluminam o dia. Lembro de Pedro Páramo, do Juan Rulfo, quando um personagem chega a uma cidade e não encontra ninguém. Aqui tem muita gente, mas estão todos em silêncio, Brasília é uma cidade silenciosa, respeitemos.

Bebo um gole d´água, tomo notas, olho o espaço entre os prédios. A grama, aqui, é mais aparada e verdinha que a do Arruda, onde joga o meu clube, o Santinha. Meus olhos buscam a pelada de domingo, o fenômeno social da bola, dos times, da busca frenética pelo gol. Nada. Nenhuma pelota rolando. Passei há pouco por um campo de futebol imenso e vazio. As traves eram duas criaturas magras e inconsoláveis. Senti falta de um drible, uma ginga de corpo, nesta manhã de domingo. Sinto uma saudade flamejante dos “ Caducos”, do Poço, e fico a imaginar quem foi o destaque na pelada do amanhecer.

Fim do intervalo, vou seguindo. Chego a um um shopping imenso, tomo um café, ligo para meu amigo Gustavo, que vem me buscar. Professor da UNB, o velho potiguar mora em Taguatinga do Norte. É lá que passo a tarde, com a Florence, Margôt, Olivier, e meu afilhado, Emanuel, que não via há cinco anos.

“ Tás lembrado do teu padrinho?”, pergunta Gustavo.

“ Não”, responde Emanuel, agora com 11 anos. O cabra está bonito como o quê.

A longa conversa da tarde, escutando “Moby” e fumando charuto, mereceria outra crônica, mas não sei, vamos ver o que diz o dia de hoje e o de amanhã. Cada dia com seu alpiste e seu vagar.

Até amanhã.


(Do gabinete do deputado Paulo Rubem, do PT de Pernambuco, a quem agradeço a gentileza)

3 comentários:

Anônimo disse...

valeu a gentileza. SEM VOTO. O PT acabou e acabou o movimento popular junto. Ninguém protesta contra nada. Nem contra a refinaria.Poluição, lixo...

Anônimo disse...

silêncio de vez em quando até que é bom... mas, meu caro Sama, volta à nossa cidade barulhenta...saudades de vc

Anônimo disse...

O silêncio de Brasília é atormenta... prefiro o nosso barulho genuino :)