Para quem anda muito preocupado com uma vida útil, para quem anda preenchendo todos os buracos da agenda com atividades as mais diversas, como trabalho, inglês, academia, cinema, cursos diversos, shopping, compras, comprar outro carro, aniversários diversos, casamentos, sempre correndo muito e com um inseparável celular no pé do ouvido, sugiro a leitura urgente do maravilhoso Mark Twain – “Dicas para uma vida fútil: um manual para a maldita raça humana”, publicado recentemente pela Relume-Dumará.
Comecemos pelo fim. “Fumo, alimentação e saúde aos 70 anos”, um discurso em 1905. Twain diz esta idade é o momento em que o sujeito pode deixar de lado as “decorosas restrições” que o oprimiram e postar-se sem medo e sem vergonha no seu terraço no sétimo andar, olhar para baixo e ensinar – sem qualquer censura. “Pode contar ao mundo como chegou lá”.
A partir dos 40 anos, avalia o escritor, “nossas manias ficam permanentes”, coisa que concordo plenamente, apesar de só estar com 36 e já ter muitas. “A partir dos quarenta anos, mantive a hora de ir para a cama e me levantar – e esse é um detalhe importante”. Ele transformou em lei algo precioso – só deitar quando não houvesse mais ninguém com quem conversar, e criou uma regra – só se levantar da cama quando fosse preciso. “Isso criou uma inabalável regularidade da irregularidade”, diz Twain. “Foi o que me salvou, mas teria condenado outra pessoa”. Outras observações do escritor:
“Transformei em lei não fumar mais de um charuto por vez. Não tenho outras restrições em relação ao fumo”.
“Sempre tive por lei não fumar dormindo e não parar de fumar quando acordado”.
Mas Twain também teve seus períodos longe do vício do cigarro. Vejamos como ele conseguiu:
“Reconheço que parei de fumar de vez em quando, às vezes até por meses, mas não foi por princípio, foi só para me exibir, para aniquilar os que me criticavam dizendo que eu era escravo dos meus hábitos e não conseguiria me livrar deles”.
Bingo. Vamos à questão da bebida:
“Quanto à bebida, não tenho qualquer lei. Se os outros bebem, gosto de colaborar, senão fico sóbrio por hábito ou escolha”.
Em 1882, num clube de jovens, Twain leu um “Aviso aos Jovens”. Começou num tom eloqüente- “obedeçam sempre aos pais, quando na presença deles”. Lembrou que essa era a melhor política a longo prazo, pois, “se não desobedecerem, serão obrigados a obedecer”. Twain foi mais longe. Disse para os jovens respeitarem seus superiores (se os tivessem), os estranhos e, às vezes, aos outros.
“Se uma pessoa lhe ofender e você ficar em dúvida se foi proposital ou não, não tome atitudes radicais, basta esperar uma oportunidade e acertar um tijolo nele. Isso basta. Se descobrir que essa pessoa não tinha a intenção de ofender, seja sincero e confesse que agiu errado ao atingi-lo com o tijolo”.
Twain sugere que o jovem que reconheça isso “como um homem” e diga que foi sem querer.
“Sim, evite sempre a violência, estamos em tempo de caridade e gentileza, tais coisas já não têm mais lugar. Deixem o uso da dinamite para seres inferiores e grosseiros”.
O livro tem ótimas dicas para nós, pobres brasileiros, que vivemos sendo importunados pelas companhias telefônicas, de cartão de crédito, pelas moças da cobrança, com aquele insuportável “eu vou estar te mandando a fatura”, sempre a chateação toda no gerúndio.
Vejamos alguns assuntos que Twain aborda, que vão me inspirar para muitas novas crônicas:
“Reclamação sobre serviços não confiáveis”;
“Aviso de guarda-chuva roubado”;
“Apelo contra blasfêmias precipitadas”;
“Assinatura de revista não solicitada”;
“Sobre telefonemas e blasfêmias”;
“Aviso. Ao próximo ladrão”;
“Sugestão para pessoas prestes a entrar no céu”.
O livro é delicioso, mas a minha frase predileta é esta:
“A vida ideal consiste em ter bons amigos e uma consciência sonolenta”.
Acabo de dar uma bocejada, amigos. Tenham um bom dia.
4 comentários:
Sama querido,
Acho que você poderia ter colocado "Dicas para uma vida verdadeiramente útil"! E viva o ócio!
Beijo!
Querido Samarone,
A última vez que lhe avistei vc estava aguando as suas plantinhas em frente a sua casa.Provavelmente antes de uma soneca de fim de tarde fruto de tanta inspiração.
Beijos,
EU
vivo ócio,
morto ele não está.
tudo para fazer no nada,
corro para fazer o nada.
espero, contudo,
que um dia,
tudo não seja nada.
Caro Samarone, provavelmente nunca verás este comentário, porque hoje é 23/10/2007 um ano depois deste post... ;D
O sehor um professor e eu uma aluna do 2 ano do E.M. que adora escrever, coisa que, modéstia a parte, faço bem.
Se um dia estiver interessado: ocafofodoskimuras.blogspot.com
...lembranças...
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