quinta-feira, 2 de março de 2006

Ó quarta-feira ingrata...

O Carnaval foi perfeito, cada dia com sua folia, brinquei muito, encontrei as pessoas queridas, mas já na segunda-feira, existia aquela questão filosófica que sempre discuto com o professor Davi: por que a quarta-feira de cinzas chega tão rápido? Como diz o velho frevo, "a gente esquece tudo quando cai no frevo/ e no melhor da festa/ vem a quarta-feira".

É um mistério. No meu caso, o fatídico dia chegou com uma entrevista, para realizar no início da tarde, um free lancer para pagar as contas atrasada, que são muitas, garanto. Mas ninguém merece fazer uma entrevista em plena tarde da quarta-feira de cinzas, enquanto o “Bacalhau do Poço” se concentra para sair, e os amigos todos estão ainda na folia.

Lá vou eu. Na hora de descer do ônibus, errei a parada, desci um ponto antes do shopping e fui logo assaltado. Dois caras com um trinta e oitão que eu vou dizer. Entreguei a bolsa e fiquei com R$ 3,00 no bolso, mas escapei vivo, apesar da tensão completa. Os ladrões devem estar com ódio de mim. Levaram a bolsa de pano que Emília me deu de presente ano passado. Dentro, uma agenda, dois blocos de anotações e o “Livro do Desassossego”, do Fernando Pessoa. Nem um tostão, nem celular, cartão de crédito, nada. O que eles queriam, eu não tinha, o que eu tinha, não servia para eles.

Duzentos metros depois, tinha uma guarita da PM, informei o episódio e os três policias ficaram me olhando com aquela cara de quem está só esperando terminar o horário do plantão, um tédio misturado com omissão, essa é a Polícia de Pernambuco, voilá.

“Foi ali na esquina”, disse eu, apontando o dedo ainda meio trêmulo. Não sou esse homem todo, capaz de ser assaltado com um revólver e ficar sem se tremer.

“É esse pessoal da favela”, me respondeu um.

“É bom ir na delegacia, registrar a ocorrência”.

Foi tudo.

A entrevista foi transferida das 14h para 16h, e a ressaca comendo no centro. Fui de táxi, com um fotógrafo e assistente, para um hotel depois de Calhetas, quase uma hora de viagem com seu César. O hotel não era aquele, era outro, que ficava na metade do caminho, nos deram o endereço errado, e só fizemos mesmo foi perder tempo. Na volta, pegamos aquele baita congestionamento dos carros que estão vindo do litoral sul. É hoje! Já entardecendo, pedi para parar o carro e fui num fiteiro, comprar uma cerveja. Só tinha Nova Schin. Tem muita propaganda e tal, mas a cerveja é ruim, vos garanto. Foi ela mesmo, e fiquei com aquele sentimento de ter pisado em rastro de corno, que dizem dar um azar danado.

Acabamos marcando a tal entrevista para hoje de manhã. Cheguei em casa quase 19h, com R$ 1,00 no bolso (os outros dois gastei com duas Schin em lata) e uma caneta fuleira pela metade. Onde estará meu Fernando Pessoa, foi o que pensei. Ficaria aliviado se alguém pegasse o livro e tomasse conta, pelo menos para enfeitar alguma prateleira.

Passei em Seu Vital, contei os detalhes do assalto aos amigos, escutei aqueles “vige nossa senhora”, “o Recife está um caso sério” e frases consoladoras no mesmo estilo, mas que não consolam nunca, depois fui em casa, botei um calção e fiquei brincando de molhar a meninada na rua. Foi o que salvou o dia, ficamos todos ensopados e ainda corremos atrás de Teresinha com um balde, para dar um banho nela. Ela escapou por um triz. Resultado: faltou água em casa.

Por fim, o Santa Cruz perdeu de 2 x 0, pelo Estadual. Só me restou mesmo dormir.

Mas tirando esses detalhes da quarta-feira, o Carnaval foi lindo, garanto. O povo pernambucano é um povo que sabe brincar, e isso é da alma. Ano que vem tem mais. E la nave va.

5 comentários:

Anônimo disse...

a minha saudade é uma terrível quarta-feira de cinzas.
cuida-te samarote

Anônimo disse...

Reclama não, Samarone. Você pôde ao menos ter seu carnavalzinho. O meu teve todo ele um gosto de quarta-feira, já que não posso mais participar. Precisava ver meu olho guloso quando uma banda passava, ó crueldade, djusto embaixo da minha janela.

Anônimo disse...

Sama, tirando a derrota do Santa, lamento por tudo o q houve nessa quarta-feira pra-lá-de-ingrata. Só q tu ainda tivesse sorte. Os cara da puliça ainda podiam ter te prendido, como normalmente costumam fazer com quem não é rico e branco.

Anônimo disse...

Sama,

vixe Maria! Recife tá um desassosego mesmo e a polícia decepcionante. Viu o caso dos garotos que foram obrigados a pular no rio Capibaribe? Espero que tempos melhores cheguem.
Abração do mano PH

Anônimo disse...

Sama, para de ficar andando pra lá e pra cá dentro de casa. Acho que é isso que tá te dando azar, cara !