sexta-feira, 4 de agosto de 2006

Pequenas histórias de amor, volume III (uma Blognovela)

Ela o conheceu há muitos anos, no bar Segunda sem lei, e comentou com a irmã, sem pensar duas vezes:

“Eu vou casar com ele, e hoje vou dançar com ele”.

Parecia uma premonição. Não dizia quando iria casar com ele. Para aquele momento, se contentava em dançar com ele. Então, Alessandra Lisieux de Holanda Lins chamou Geraldo Ferreira de Lima Júnior, o Gerrá, para dançar. E dançaram. Mas ficou por ali a gestação do amor. Muitos anos depois, ao me contar a história, com os olhos brilhando, ela lembrou o que a fez dizer aquela frase tão decisiva.

“Era o jeito, a boca, isso sempre me chamou muito a atenção”.

Mas a vida é cheia de atalhos, e como é muito comum na vida, os dois desencontraram. Sejamos mais simples: foram viver o que precisavam viver, antes do reencontro. Ela virou advogada, casou, ele se formou em administração, virou técnico do Judiciário, saiu namorando pela vida com outras garotas. Em 2001, aos 29 anos, ela fez uns exames de rotina, e descobriu que estava com um aneurisma cerebral. Fez uma cirurgia no cérebro, me mostrou até as marcas da operação, saiu do circuito, quatro meses recolhida.

“Por isso curto mais a vida. Todo momento agora é importante”, diz Alessandra.

Neste período, ela decidiu separar, e eles seguiriam por aí, ao deus dará, se não tivesse aparecido no caminho dos dois uma outra paixão – um time de futebol. Sejamos mais específicos, o Santa Cruz Futebol Clube.

Gerrá, neste momento, fazia parte de um grupo que tentava, inutilmente, refazer os caminhos administrativos do clube, conhecido por viver um estranho paradoxo: um clube de massas, com um estádio com capacidade para 80 mil pessoas, nunca consegue sair do vermelho. Bem, mas isso é assunto para outra crônica.

Pois bem, Alessandra é apaixonada pelo Santinha, como chamamos aqui, Gerrá não menos. Recuperada, separada (de um rubronegro, diga-se de passagem), ela voltou a fazer algo que é parte de sua vida: ir ao estádio, ver seu time jogar. Ficou sabendo do grupo que estava tentando reorganizar o clube e decidiu participar.

“Quando fui à primeira reunião, descobri: é ele”.

Quantos anos haviam se passado? Eles não sabem. Ah, meus amigos, deixemos a razão de lado. O tempo do amor não se conta assim, com o passar dos anos. Para ela, poderiam ter passado somente alguns segundos, desde aquele encontro no bar.

“Só me lembro dele, as datas não. Quando as pessoas são marcantes, a lembrança fica”, diz Alessandra. Mas ela não fez alarde sobre aquele rapaz falante, simpático, e que começava a tocar zabumba.

Começaram a ir para o estádio juntos, depois, um lançamento de livro, aquelas aproximações serenas, sem muito alarde, essas que vão pegando a pessoa sem ela nem perceber. No final de 2001, após vários jogos, comemorações, vitórias e derrotas, o primeiro beijo. Mas o malandro do Gerrá ficou por ali, tapeando. “Só aquele rolinho de vez em quando”, contou ele. Ela bateu o pé. Não queria esse negócio de rolinho. Disse até uma frase que eu nunca tinha escutado:

“Não gosto desses parraxaxá não”.

No Reveillon, ela foi para o Marco Zero (para quem não conhece o Recife, é uma praça na parte mais antiga da cidade), ele foi para a praia de Boa Viagem. Pelo andar da carruagem, cada um pegaria um novo atalho, certo?

Errado. Entrou aí o que meu amigo Gustavo chama de “concomitâncias”, que traduzo parcamente como “simultaneidade”. Coincidências não existem.

Amanhecia o dia, o primeiro dia de 2002, Gerrá estava saindo de Boa Viagem (não perguntei se estava cheio dos quequéus, mas creio que sim), e Alessandra tinha saído do Marco Zero, para encontrar as amigas em Boa Viagem. Foi ele dando a primeira acelerada, e ela aparecendo no calçadão. Não perguntei, mas acho que ela estava de vestido, os cabelos desgrenhados, cheia dos paus e descalça, como um bocado de mulher daqui do Recife e do resto do mundo, após o Reveillon.

Ele parou. A primeira frase do casal que começava a nascer foi linda:

“Vou ao Mercado da Madalena comer. Quer ir?”, disse ela.

“Quero”, respondeu ele.

O Mercado, que nunca fecha, estava fechado. Acabaram no poético Posto Nassau, perto do Aeroporto. Antes mesmo de ficarem juntos, já saiu a primeira arenga. Gerrá comentou que uma amiga dela tinha “muita saúde”, um recurso baixo do ser humano masculino, para dizer que uma mulher é muito da gostosa.

“Era para eu ter dado uma surra nele ali mesmo”, conta Alessandra.

Mas ela não deu a surra. Deu foi o ultimato:

“Só me ligue se quiser namorar comigo”.

À noite, o malandro ligou, desconfiado.

“Alessandra...”

“Que é?”, respondeu ela, já enfezada. “Olhe, saiba que se for pra ficar junto, é pra ficar junto mesmo”.

Começaram a namorar. Veio o Carnaval, que é um teste de fogo para qualquer casal que está começando ou terminando. Eles não só passaram a folia juntos, como ajudaram a criar o bloco “Ou esfola ou arrebenta”, que continua esfolando e arrebentando até hoje.

(Amanhã eu conto o que aconteceu de 2002 a 2006, para criar aquele clima de suspense. A Globo não tem sua “Páginas da Vida?” Então eu também posso ter minha blognovela).

Aguardem. É a melhor parte, garanto.

8 comentários:

Tiago Nobel disse...

Tu deveria escrever romance também! Tem uma habilidade única para prender a atenção! Mal posso esperar pra "ver" as cenas dos próximos capítulos! Abração!

Anônimo disse...

Eu já tô esperando.......

cometaurbano disse...

Sama, as histórias de amor estão ótimas. Sugiro criar um "bolão" para advinhar o final da blognovela. Os amigos que conhecem o casal não podem participar.
O meu palpite é que eles casaram na terça de carnaval depois de fundarem o bloco. Ela entrava dançando frevo em uma das ruas do antigo Recife e o bloco todo estava lá para testemunhar. Ele a esperava ansioso em um pequeno boteco. Na saída para a lua-de-mel eles se desencontram na multidão.
Abraço do leitor fiel. PH

Anônimo disse...

Aproveita e coloca no novo estuário as crônicas que não entraram. Se vc não colocar, vão continuar achando que sou louco por escrever sobre o que não existe.
João Valadares

Anônimo disse...

João: tu não sabe que a propaganda é a arma do negócio? Ainda tem leitor procurando pelas cronicas que tu comentasse, e que nunca escrevi. Como diz o velho sábio, chala la la la...
samarone

Anônimo disse...

ehehehehh
Blognovela.... muito boa..
Este é o velho Sama.. inovando até nos formatos internéticos..
Muito boa essa história.. podíamos até vender o roteiro pra globo, sbt ou record q tá entrando no mercado agora(eu agenciava, ficava com uma pequena porcentagem e tals..)
Abraço forte...
Thiago

Anônimo disse...

Olha aí Sama, vc voltando com as "Pequenas histórias de amor..."!!! Vc não tem idéia de qto gosto delas! rsrs
E agora tô aqui, curiosa pra saber o que aconteceu entre 2002 e 2006.
Mas, uma coisa é certa, o amor é como os Deuses, se vc não acredita ele deixa de existir...
Parabéns Alessandra pela sua fé no amor!!
E pra vc Sama, parabéns por mais esse texto. Adorei!!

Anônimo disse...

Vamos esperar o segundo capítulo para comentar a história.