Depois dizem que eu invento histórias. Se eu tivesse o poder de inventar tantas histórias, estaria escrevendo ficção, porque ficção dá muito mais dinheiro que a realidade, e ando num liseu brabo, previsto para encerrar agora em setembro.
Estava em Fortaleza, outro dia, e fui ao encontro de um velho amigo. Foi lá que encontrei o sujeito, que não lembro o nome. Pois bem, o cara trabalha no IBGE, aquele mesmo das estatísticas. Só depois entendi porque o órgão é chamado de Instituto Brasileiro de Geometria e Estatística.
Um dos trabalhos dele era excelente: encontrar “vazios cartográficos”. Ôps, isso aqui vai render uma crônica supimpa, pensei, já puxando uns guardanapos, para anotar a conversa toda. Ele me explicou, de forma bem articulada e detalhada, o que é um “vazio cartográfico”:
“Existe o lugar real, mas não existe no mapa”.
O cara viajou para os lugares mais remotos do Brasil, à procura do que não estava no mapa. Cafundós do Judas, Onde o Gato perdeu as Botas, Terras do Sem Fim, Última Fronteira, foi o que lembrei na hora.
A cerveja foi deslizando, e ele foi se empolgando. Eu caçei minha caneta e mandei ver. É hoje que faço uma crônica arretada, pensei, mas depois perdi os tais guardanapos, e só hoje, mais de um mês depois, os encontrei, nos bolsos de um bermudão.
“É como se você fizesse a base da casa e precisasse de um endereço”, disse meu amigo.
Numa cidade que não lembro o nome, perto de alguma fronteira ali, na Bolívia, creio, ou é perto do Acre, sei lá. Sim, nesta cidade, ele viu uma orelha pendurada e perguntou pelo troço. Foi um caso envolvendo um paulista.
“Ele chegou todo metido a boi e comeu a filha do coronel”.
Não entendi o “todo metido a boi”, mas não vou ficar perguntando todos os detalhes, que isso estraga qualquer conversa.
O coronel, soube deu uma prenda:
“Você vai casar com minha filha, mas vou me vingar”, e zapt! – passou a faca no escutador do rapaz.
Um certo dia, na Amazônia, estava num povoado tão ermo, tão fora do eixo temático do planeta, que nem sequer tinha uma caninha para a turma do IBGE. Pelo que vi na mesa, esse pessoal bebe pacas. Pois bem, eles pegaram o helicóptero da FAB e foram ali, dar um passeio em busca de uma lapadinha. Amigos, que cana cara do oeste! Minha preocupação era somente uma: e se o piloto do helicóptero ficasse bicado?
"Por precaução, compramos a cana e voltamos para beber na comunidade", me explicou o camarada já citado. Ufa! Eu sou um sujeito preocupado com os destinos da humanidade.
Depois da singela história, ele me informou que tinha mudado de setor. Está agora no setor de “gravimetria”, que é onde estão aqueles sujeitos encarregados, de medir a força gravitacional do planeta. Fiquei sabendo inclusive de algo da maior importância: a força gravitacional do planeta Terra é de 9,8 m2.
O programa utilizado para essa medição é o “Super”. Achei o nome muito simplório.
“Cada lugar tem uma força gravitacional diferente. Você vai lá e mede a força”, contou.
Eu, muito modestamente, e que ele não saiba, achei que o esforço é legal, mas não entendi direito para que tanta parafernália.
“A força da terra e geoidal”, detalhou.
Fui ficando cada vez mais impressionado com a importância das profissões que desconheço, inclusive espero despertar em alguns leitores mais jovens, o interesse pelos “vazios cartográficos e gravimetrias”.
“Através da força, consigo achar a superfície da terra”, explicou.
Pensei em dizer que acho a superfície da terra pisando no chão, mas podia complicar o papo. Depois ele explicou que os equipamentos utilizados são dos norte-americanos, uns troços dos anos 40, e que funcionam bem. Neste setor, ao contrário dos demais, eles estão mais desenvolvidos tecnologicamente que a gente, foi o que entendi.
O gravímetro, um instrumento de medição da terra, tem uma constante: é 50 graus.
Fiquei pensando muito secretamente: qual deve ser a força geoidal do Poço da Panela?
***
Nota: Hoje (sexta-feira), às 15h, estarei debatendo “Literatura contemporânea: circulando a letra, a voz e a imagem”, na Escola Kabum! Como a mesa tem nove participantes, minha esperança é ficar por último e fazer apenas os agradecimentos. Continuo um tímido que vai escapando pela tangente. Queria mesmo era estar na mesa "Elogio da Bobagem", na UFPE, dia 25, ao anoitecer.
7 comentários:
Caro Sama,
Onde fica a Escola Kobum?
E essa mesa "Elogio da Bobagem" no dia 25 de agosto as 18:00 horas??? na UFPE??? onde?
Beijos,
Eu
Vivendo e aprendendo, Sama ! Não sei como sobrevivi até hoje na ignorância quanto à força geoidal do nosso planeta ! Tua crônica me fez lembrar o personagem vivido pelo grande Walter Dávila, na Escolinha do Prof. Raimundo. Certa vez, o mestre fez a pergunta: "Qual é o peso da Terra ?", e depois de meditar uns segundos, o aluno devolveu: "Com gente ou sem gente ?"
Sama, vou lhe pedindo licença para divulgar entre seus leitores a mesa-redonda "Do Frevo ao Pós-Mangue", do qual participarei com o Maestro Spok e o músico Publius. É no Teatro Hermilo, terça (dia 22), às 10:30 da manhã. Depois, vou comer uns caranguejos com pirão e pimenta ao som do Último Dia, de Levino Ferreira.
eita: leia-se aí acima "da qual participarei".
Julio
Julio, estarei dando aula neste dia. tentarei levar os alunos. depois, eles vão pra casa e nós vamos ao pirão.
sama
Beleza, Sama. No final, haverá uma apresentação do pessoal da Escola do Frevo, lá da Encruzilhada, uma gurizada que foi a Nova York e arrancou o segundo lugar num festival internacional de dança, este ano. Vale a pena levar os alunos. O pirão é por minha conta!
Sama, na verdade a aceleração da gravidade é que é de 9,8 m/s2.
Utilizando a fórmula S = So + Vot + 1/2 at2 temos que:
Se o piloto bêbado do helicóptero deixasse teu amigo cair a uma altura de 500m do chão, teu amigo se esborracharia no vazio cartográfico (chão)10 segundos depois a uma velocidade de 98 km/h.
Em outras palavras, se beber não pilote helicópteros!!! grande abraço.
Grande Sama, é 9,8 m/s2. Mas pra efeito de cálculo pode se adotar 10m/s2.
Abração
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