segunda-feira, 3 de dezembro de 2007

Em Canudos

De Canudos, Bahia, e usando um computador sem varios acentos.



Esta foto foi tirada no Mirante de Canudos, onde tem uma estatua de Antonio Conselheiro. Embaixo, esta o acude Vaza Barris. Debaixo d´agua, restos de escombros do que restou de quatro batalhas.

Encontramos seu Altino Soares de Oliveira numa esquina erma, em Chorrocho, com a poeira comendo no centro, o calor derretendo o tempo. Ali, dizem, passam os onibus com os universitários, que vão para Canudos. Seu Altino puxa conversa, fumando seu cigarrinho de palha, os dedos cheios de calos da agricultural. Falamos que estamos a caminho de Canudos, ver a cidade fundada por Antônio Conselheiro, ele conta que seu avô se chama Pedro Calixto de Oliveira, foi um jagunço forte, brigou como o diabo, isso era para estar entre aspas, mas nao sei onde estao as aspas. O avo dele se esbaldou pelo mundo e nunca mais foi encontrado, depois aguardou a poeira baixar e retomou a vida, sem muito alarde. Seu pai, o de Altino, se chama Amancio, e costumava pegar restos de armas de Canudos, serrar e fazer novas armas. Ele fala de um resto de artefato da guerra, que guardou em casa, e pedimos para ver.

Ele entra em casa e traz um troço feito de aço, pesadíssimo, enferrujado, parecendo um bomba em miniatura. Foi usada pelo Exercito em Canudos, diz. Depois explica o formato e funcionamento de algumas armas, como a Lazarina, que era leve, e empregada como soca-soca. Depois, a Combrea, espingarda de controle de agulha, que para mim permanece um misterio, e finalmente a Carabina, de dois canos, que chamam tambem de Rifle quarenta e quatro, porque o teclado esta com problemas nos acentos e nos numeros. O quarenta e quatro pode ser chamado tambem de rifle papo amarelo, entre aspas. A Manu Licha era a arma que mais rompia, porque a cabeca da bala era de aco.

A conversa foi interrompida pelo onibus que vinha de Belem de Sao Francisco, entupido de universitarias. O primeiro refugou, mas o segundo nos abriu as portas, e economizamos cento e cinquenta quilomentros, creio.

No caminho, conhecemos as criaturas mais adoraveis do planeta, estudantes da Cevasf, como a Neide, da Historia, Jaqueline, Gabriela, Jaadi e Jeiza, de Letras, Adila, da Historia, e Adriana, Letras, e mais a Fernanda, de Geografia. Conversamos muito, a viagem inteira, e fico sabendo pela Neide, que estuda historia, que o acude Vaza Barris, entre aspas, foi feito pela ditadura, para encobrir a historia.

Ao entardecer, estamos em Canudos, e descobrimos que a cidade esta vivendo um pequeno frenesi, que e a peça Os Sertoes, dirigida por Ze Celso. Todos os hoteis e pousadas estao ocupados, muitos moradores alugaram quartos etc. Ficamos de bobeira, e somos salvos pelas meninas da viagem, que oferecem banho. Tomo banho na casa da Gabriela, Marai vai para outra casa, Ailton Guerra para outra.

Vamos tentar assistir a peca, que vai abordar a luta em Canudos, parte I. Converso com a produtora, digo que vou escrever textos para o Estuario, ela recebe a noticia com o desdem necessario, depois pergunta pela minha carteira de jornalista, acho um saco isso de usar carteira de jornalista para entrar nos cantos. O ingresso foi vendido de manha a um real, e a revenda chega a vinte mangos por bilhete. Quero ver a peça somente por um motivo - estão apresentando em Canudos, palco da guerra.

Iramarai e Ailton não dão muita bola para a peça. Todos estamos exaustos. Fico por ali, por ali, olhando o povo, então me chega um rapaz e oferece três ingressos por vinte e um mangos, ofereco vinte, acaba saindo por dezessete, lembrem que o teclado não tem numeros, e amanhã consertarei o texto. Na entrada, a produtora acha ruim porque comprei de cambistas, eu quase volto.

Assisti três horas de Os Sertões, fiz um esforço intelectual e afetivo sem limites para sentir algo que cheirasse a emoção, mas faltando vinte minutos para o intervalo, vi que o Sertão do Ze Celso não passa nem perto do meu. Encontramos um espanhol e uma baiana, gente cabeça, eles disseram que era preciso esperar uma cena linda no final da peça, mas fica para a próxima, em três horas, dava para ver algo lindo.

Dormimos no box de um mercado e na manhã seguinte, a feira de Canudos estava espalhada pelas ruas. A diversidade das cores, gentes, produtos, preços, me lembrou a feira que tinha aos sábados, na casa da minha avó, no Crato, e foi melhor que a peça.

Então conhecemos dois personagens impagaveis, no meu primeiro domingo em Canudos. O Antônio Mergulhador, ou Antônio da Cruz Silva, e seu Cândido Pereira da Silva dos Santos, de sessenta e três anos.

Escreverei sobre eles e sobre outras criaturas que esbarramos, durante o dia, quando achar um computador que tenha acento e numeros, porque estou ficando impaciente.

8 comentários:

Raphinha disse...

Inveja, mil perdões mais a palavra é essa. Tive um professor de história aficcionado por Canudos e acabei me interessando também, mas um dia eu chego aí! Que você aproveite bem a estadia e nos conte tudo que viu e ouviu! Vou aguardar verdadeiramente ansiosa!

Abraço.

Anônimo disse...

Samarone, nunca vi uma peça do Zé Celso mas já li algumas coisas sobre o trabalho e importância dele pro teatro nacional.

Quando essa peça foi montada em Recife, meses atrás, foi um rebu danado pelas cenas de nudez, vamos ver como será nas brenhas da bahia.

Um abraço.

Anônimo disse...

Sama,
para assistir a uma peça de Zé Celso, tem que esta descançado, pois ela exige esforço físico também do espectador, e, nem todos irão gostar...
Boas histórias as tuas andanças... já voltasse? Ou só Peste retornou, ontem ele ligou para mim...
Um grande abraço,

Anônimo disse...

Sama
Preciso falar contigo. Tás checando qual email? Ivanzinho

Anônimo disse...

Nada se inventa em nenhum mundo, muito menos no das letras. Por isso, meu caro amigo, "parafraseei" suas pequenas invejas despudoradamente no meu espaço.

Estás viajando com Iramaraí, é? Aproveita e dá um recado pra ele, Sama: que tenho fotos de uma exposição antiga, esculturas de madeira, que ele fez lá no La Prensa. Caso ele ainda as queira...

Beijos e boas histórias,

Karyna

Anônimo disse...

Sama,
nem com todos os agradecimentos que faço a Deus, pagaria, a expericiencia que ele me deu. Nesta viagem, confesso a voçes que tive tres momentos, o primeiro com o grande grupo, Mãe Coruja, tendo a frente, a nossa querida, "Bebete", o segundo momento com voçe e o Iramarai, e o terceiro sozinho, na estrada, obrigado a voçes, pelas gargalhadas, o silencio, emoções, gritos, cansaços, ansiedade e todos os outrios sentimentos que colhemos nestas, nossa intervenção no Sertão.

Anônimo disse...

Sama, impaciência da gota com Os Sertões do Zé Celso! No Recife, A Luta foi encenada em duas partes, cada uma com umas cinco, seis horas de duração. Pra quem está cansado, realmente é dose. Assisti a primeira parte, que tem cenas lindas, como o enterro dos sertanejos após a primeira batalha, ao som de uma incelença de arrepiar. Há também o som de "Luar do Sertão", a voz incrível da cantora/atriz, acompanhado por um acordeom, ao fundo uma projeção do céu estrelado no cenário (só pra citar essas pequenas passagens). No todo, as seis horas e pouco foram uma experiência e tanto!

Anônimo disse...

Realmente é uma maratona e tanto assistir a peça Os Sertões do maravilhoso Zé Celso. Foi como uma rave em pleno sertão, nas suas quase 30 horas de duração. Assistir três dias e fiquei triste por não poder ficar mais. Mas nos dias q fiquei foi só emoções e arrepios com a peça. EVOÉ!