quarta-feira, 5 de abril de 2006

Mini-confissões aleatórias

Já fiz Yoga uns dois anos, três meses de box, duas aulas de Tai-Chi. Já viajei num teco-teco lotado, na Amazônia, e tive certeza que iria morrer. Já distribuí cigarros para os presos do Carandiru. Já passei um mês no meio de uma tribo indígena. Aos treze anos, queria ser maratonista. Nesta época, parei de comer carne por quase dois anos. Esperava meu pai sair para o trabalho e pegava a Playboy, debaixo da cama dele. Já acordei numa calçada de Olinda, numa quarta-feira de cinzas, sem óculos e liso. Já saí do estádio do Arruda dentro de camburão. Vi o Carandiru sem implodido e festejei. Já assisti uma peça com ex-presos políticos, no DOPS de São Paulo, e me emocionei. Já fui a única pessoa a assistir uma peça, em São Paulo. Já entrevistei dom Paulo Evaristo. Sonhei que entrevistava Ernesto Sábato. Já roubei livros em várias livrarias, até da Livro 7 (Tarcísio que me perdoe). Adoro roubar canetas dos amigos. Sou um pidão de marca maior, mas adoro dar presente. Já sofri muito por amor. Recusei inúmeras vezes experimentar cocaína. Já enterrei meu cachorro mais querido no quintal de casa. Já fui dono de bar duas vezes (toc!toc!toc!). Tenho o costume de beber água da torneira. Adoro canto gregoriano e os bregas dos anos 70. Ainda lamento ter perdido o vinil com a narração dos gols da Copa de 70, que escutei muitas vezes na infância. Acho o jogador Tostão, com a camisa da Seleção, uma pintura de Deus. Sempre piso nos óculos, quando estou muito liso. Já fui sonâmbulo na adolescência, fiz um monte de eletroencefalogramas, infelizmente nunca descobriram nada. Tenho um medo ancestral e irreversível de altura e da estupidez humana. Achei a Monalisa, no Louvre, uma bobagem. Posso me alimentar uma semana somente de fruta-pão e café. Detesto gente que acorda de mau-humor. Não suporto o hábito de aplaudir qualquer besteira de pé. Acabo uma amizade se a criatura não responder um bom-dia. Tenho saudades das camisas do Santa Cruz dos anos 70. Gosto de longas conversas com crianças. Fico fodido quando perco a pelada dos Caducos, no domingo. Adoro tomar chimarrão de manhã. Estraguei meu paladar no Restaurante Universitário. Qualquer comida me agrada. Detesto whisky de qualquer marca. Já usei Kichute e Conga. Já usei tamancos. Perdi o ânimo por discussões fortes sobre qualquer assunto. Guardo um pedaço da sardinha na lata, para o dia seguinte. Pior que isso, como o restante no dia seguinte achando ótimo. Adoro conversas pontuadas por longos silêncios. Penso em fazer um doutorado sobre Juan Gelman. O sorriso de Lulu é um presente de Deus. Nunca aprendi a jogar dominó. Acho Truco mais difícil que o cateto da hipotenusa. Não moraria nos Estados Unidos nem que me pagassem uma bolada. Adoro conhecer, antes de tudo, a biblioteca de qualquer casa. Gente séria me deixa empulhado. Mexo na geladeira dos outros sem parcimônia. Sou péssimo para decorar nomes. Só consigo ler riscando o livro inteiro. Tenho diários há quase 20 anos. Adoro varrer minha casa. Adoro os olhos das pessoas. Só peço alguma coisa antes de saber o preço. Já tive um lindo Fusca 68, e o acabei num Honda. Adoro pedir demissão dos lugares. Adorava me mudar de casa, até chegar no Poço da Panela. Gosto de rezar no terço que foi da minha avó. Acredito em todos os orixás. Acho “Educador” uma palavra linda. Acho a Gisele Bünchen uma magra sem graça. Não suporto taxista calado. Se tivesse muito dinheiro, daria bolsa de estudo para meus amigos tocarem seus projetos. Já fiz terapia, até que minha terapeuta foi morar no Sertão, e tudo voltou à normalidade. Concordo com Lourival em duas coisas: 1) toda memória é atravessada por uma aleluia; 2) o afeto é uma pátria.

13 comentários:

do ás ao rei disse...

talvez crie coragem algum dia e me confesse desse jeito, sem que haja o segredo do confessionário, nem a culpa pelos meus atos...

abraços velho Sama

Anônimo disse...

Puxa... que coragem, hein??

betita disse...

És impressionante, meu querido Sama.

Anônimo disse...

Sama, essas confissões só podem vir de você mesmo. Mas, uma vez, arrasou.
bjs

Anônimo disse...

Confesso: minho vício é ler as suas crônicas. São maravilhosas. Ah, mas outra confissão, adoraria ouvir suas histórias.

Abraços.

Anônimo disse...

O que posso dizer... Está crônica está simpática e saborosa!

Grande abraço, Priscila

Anônimo disse...

Eu também confesso: adoro ler tuas cronicas!Sao lindas!
um abraco,
Claudia

Anônimo disse...

Hoje não tem crônica porque o santinha perdeu? :(

Anônimo disse...

O engraçado, é que já sabia de um monte disso tudo, tendo convivido tão pouco contigo, sinal de transparência :)

Anônimo disse...

poxa sama, giselle bunchen é o que há!!!

Anônimo disse...

Caro Samarone, nunca o vi mas agora já posso dizer que o conehço pelo avesso. Adorei a crônica.

Anônimo disse...

Lindo! Meu filho, você fez uma síntese maravilhosa de quase tudo. E eu também "Adoro os olhos das pessoas". Um beijo de mãe.

Anônimo disse...

Sama, desculpa chegar tão tarde nessa elegia. Não sou tão desapegada quanto você, mas compartilho as simplicidades. O comentário de sua mãe me emocionou. Será que é um sintoma de mãe-que-sou? Beijos. Adriana Dória